quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Parênteses para uma crônica: NOSSAS LIVRARIAS


Realmente é triste e espantoso. Há poucos dias, atendendo ao impulso quase vício de entrar em livrarias, perguntei a uma vendedora pela estante de literatura brasileira, pois, o que se via eram letreiros como literatura estrangeira, autoajuda, administração, esotéricos, idiomas, etc., menos o que eu procurava.
Não havia um letreiro literatura brasileira ou nacional, muito menos de poesia. A gentil vendedora mostrou-me, em uma gôndola, dizendo: Aqui, senhor, na parte de baixo. Perguntei-lhe pelos livros de poesia, ao que ela respondeu ‘Ah, poesia? Olha, só temos esses aqui’. Havia alguns livros de Ferreira Gullar e de Fernando Pessoa, misturados a uma miscelânea de romances e contos em português, de autores já consagrados. Como de outras vezes, senti-me imerso numa banheira de gelo, até cair na real.
Caí na real, mesmo às vésperas de completar uma dúzia de livros publicados sob demanda. Esse tipo, o de pequenas tiragens, ainda é o mais acessível. Por outro lado, essas editoras não têm a penetração que as tradicionalmente famosas têm. A venda é difícil, temos que ir a campo, no porta-a-porta, como vendedores de cocada, que arrecadam bem mais nas campanhas de quermesses. Esses têm a boca adoçada pelo açúcar queimado das cocadas... Nós... A  boca amarga pelas palavras de tristeza e revolta contra a ganância das grandes editoras, que estão aí para fazer dinheiro. Elas crescem na razão direta da ignorância e do desinteresse dos chamados agentes culturais. Hoje, quando se lê uma coluna de Cultura, se lê notícias de shows musicais, teatro, dança, lançamento de algum romance ou ficção, que fazem parte da cultura dos povos, mas, nem sombra do que venha a ser poesia. Um jornal conceituado do Rio estampa em uma página Prosa e Verso. É um colunista que escreve. De verso, nem o reverso.
A poesia pode estar em tudo que vemos, para nós poetas. Para os não poetas, ela é ‘jurássica’. Ela só aparece nas letras de algumas... De algumas músicas... A poesia está perdendo a contemporaneidade. A maioria das pessoas não sonha, fornica; não ama, fica; não olha nos olhos, olha no display que não sai da palma da mão; o belo não está nos versos de um livro, mas nos gadgets do isolamento físico, nos relacionamentos virtuais e nos jogos onde a máquina é o competidor! O poeta está se tornando poeta de si próprio. Eu sou um deles e, assim, continuarei a escrever poesias, ainda que para mim, e quando não mais puder escrever, pensarei poesia, pois ela nos leva por caminhos onde os transeuntes são a brisa, a água da chuva, a natureza e o canto da cotovia.

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